domingo, 7 de março de 2010

O complexo relacionamento de almas iguais

Ele era um galanteador. Gente fina, boa pinta, vivendo o melhor da juventude. Rodeado de amigos, sempre disposto a brincar e presente em todas as saídas. Curtia de tudo, ouvia qualquer música e comia qualquer coisa. Era adaptável. Conhecendo-o um pouco melhor, via-se a raiz do bom samba, da boa cerveja e do bom futebol. Um brasileiro nato. Era um figura também, sempre engraçado, sempre sorrindo, sempre brincando, sempre "simpaticando". O único problema é que o dono de todas essas qualidades era também o que carregava dentro de si um coração solitário.
Ele não tinha problemas com as mulheres. Não tinha meeesmo. Sabia conquistar, sabia conversar, sabia elogiar. Falava o que elas queriam ouvir, mandava mensagens fofas no dia seguinte, ligava quando prometia... Mas se cansava delas quando a palavra mágica/trágica começava a despontar no horizonte: rotina. Tinha verdadeiro pavor de compromissos rotineiros, de perder sua liberdade e ir todo domingo na casa da sogra. Amava as mulheres, mas amava sua vida. Simplesmente não conseguia se decidir por um ou outro caminho. E nunca tinha encontrado alguém que pudesse acompanhar aquilo.
Nunca até aquela noite.
Ela era apenas mais uma curtição. Era linda, ele sabia. Tinha tido sorte. Era simpática, tanto quanto ele. Engraçada e divertida também. E morava perto. E torcia pro mesmo time. E sabia todas as músicas do Fundo de Quintal. E ia nos ensaios das escolas de samba. E tinha gosto pela cultura popular. "Quem era essa garota?" ele pensou. Deixou o pensamento ir e aproveitou a noite.
Se viram algumas vezes. Eles se davam bem. Conviviam facilmente. Se entendiam na vida, nas conversas, na cama. Juntos espantavam, por alguns momentos, o vazio daqueles dois corações carentes e sedentos de amor. Necessitavam do amor, mas o orgulho e o amor pela liberdade não os permitia uma auto-traição. Trair as maiores crenças é sempre sublime, mas poucos são capazes de. Eram perfeitos um pro outro. Eram perfeitos pros interesses um do outro. Eram duas metades iguais de sexos diferentes.
Teriam sido felizes juntos? É provável. Mas, assim como tudo em suas vidas, "deixaram rolar" o relacionamento. Rolou tanto que não rolou. O grande problema, que eles não imaginavam, é que o carinho recíproco ficaria guardado.
Eram duas metades iguais que se separaram ainda jovens, mas que mudaram de destino cada vez se cruzaram pela vida nos anos que se seguiram. Simplesmente era incontrolável. Pertenciam um ao outro.
Eram almas gêmeas que se conheciam tão bem por se verem refletidas uma na outra, que não tinham coragem de assumir isso publicamente.
***
Naquela noite, mais uma vez, se encontraram no mesmo lugar, deixando fluir seus desejos e deixando pra traz a rotina e a familia que haviam criado e que os aprisionara naquele mundo de loucos. Gostavam de se encontrar, era nostálgico. Voltavam a ser adolescentes. Mais do que isso, voltavam a sentir o gosto do livre e do proibido. Voltavam a ser eles mesmos.
Fumaram um cigarro e conversaram a noite inteira, com pequenos intervalos para os momentos extra conjugais. Eles se amavam, se entendiam e se pertenciam. Não podiam resistir e, sinceramente, nunca tentaram.

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